segunda-feira, 27 de outubro de 2008

FECHADO

Desce poderosa a ameaça

de impedir as sem-razões

e oprimir o desconcerto

imprescindível. Cala o sonho

e uma voz, que impaciente se adivinha,

distorce a prisão. Não é verdade

que renuncies para sempre a tua ansiada

primavera. Não é possível que os anos

sacrifiquem esse instante imperecível

que voa. Não é razão essa quimera.

Não consinta o tempo dar-lhe o cetro

nem a espada. Espanta sua cor

e seu ditado. Torna mudos os sons

da terra cobiçando as raízes.

Azeda a semente e a aprisiona

com gélida petrificação. Roça o fogo

e já o apaga. Vem ver-te

e cruel te atira à paixão que te aprisiona,

ao olhar que recebe o mundo e o rechaça,

à palavra que é um castelo, e não pousada

nem varanda. Oh! Fechado ao mundo estás.

Qual silêncio te perdoa

si és voz e em mudo alento

transformaste tua existência?

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Tarde sem tempo

Quem conta na tarde os minutos

parece com o perdido buscador

de essências no quarto já disposto

para o sonho. Parece um despedido coração

que não acha seu compasso nem seu refúgio,

de tanto andar esquivo e apressado,

em favor de sua tardança enamorada.

Quem conta já não acha,

pois corta os contornos dos suaves

cromatismos. Estreita com sua lei a realidade

do que abertamente passa e se recria

em sua razão esférica e integral.

E anula com sua torpe fé

a suave sucessão de eternidades

que anunciavam a fronteira onde quis

transitar.



À AUSÊNCIA DESESTIMA

Não sofras por sua ausência.

Quando o outro não quer responder,

Dá no mesmo que se encontre em um

Oceano lunar, ou que a teu lado,

Ensimesmado em seu mutismo, tenhas

O corpo onde habita. Se percute

Seu silêncio, e persevera na distância,

Dará igual que o submetas ao encanto

de teu leito compartilhado; respirarás

somente sua distância, por mais que

os sentidos simulem o contrário.

Deixa, pois, que as medidas sejam

da alma patrimônio, e sente assim

um descanso infinito, onde o amor

desnuda suas provas e soçobros

e aparece em superfícies ou relevos,

fiel a esse olhar que à ausência

desestima.